quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Série: Os desafios do Crescimento....


Parte 1 - Crescer dói???

Estou psicóloga, escolha muito bem delineada num programa para me libertar e crescer. Neste intricado processo de me libertar das prisões que eu mesma criei, aprendo a cada dia com aqueles seres que num ato de confiança compartilham comigo suas dores, seus conflitos conscientes e inconscientes, na esperança de que eu possa lhes tirar dos quadros angustiosos que vivem.

Infantilmente, um dia acreditei que isso era possível, mas a vida que sou rapidamente se encarregou de me mostrar que somente o Ser em si mesmo pode se tirar destes quadros e que o melhor que eu podia fazer era aprender com estas oportunidades únicas, avançando no meu crescimento e acompanhando aquela Vida no seu. Aprendi que não há caminhos a se ditar para o outro e que a terapia é um processo de aprendizado conjunto, onde se exercita o respeito e a aceitação pela manifestação de outra Vida nas condições em que se apresenta.

A profissão foi o caminho que escolhi para aprender a conviver e amar, onde exercito o estar com o outro além daquilo que meus sentidos podem captar.... estar com o outro em sua dor, para que estas deixem de ser surdas e mudas e se tornem ouvidas por ele mesmo.

Nesta série de artigos que inicio aqui, falando das dores e superações do crescimento, não trago nada de novo, somente a organização de algumas ideias que fazem parte do farto manancial de informações que a Equipe de Amor a Luz vem nos trazendo ao longo destes anos, acrescidos de algumas ilustrações de casos clínicos, que com a permissão daqueles que me confiaram seus pensamentos, dúvidas e dores, reparto com vocês, ressalvadas as identidades, para que possamos caminhar juntos neste processo de libertação, avançando na compreensão da Vida que somos. Espero ter sensibilidade suficiente para conseguir transmitir com fidelidade aquilo que recebi.

Gostaria de começar questionando sobre a questão de se libertar. Libertar do que? O que tem nos travado e impedido a marcha rumo ao crescimento? O quê está nos aprisionando?

Abordando sobre a temática da esquizofrenia, o Educador Carlos nos dá a seguinte informação:

Nesse período de transição em que a criança psicológica não consegue fazer, ela fica perdida no inconsciente arcaico.... então este ser está em permanente estado de angústia ou ele cinde com toda a realidade e sofre do processo que chamamos esquizofrenia. É por isso que esta criança perdida nos porões do vosso inconsciente ou do que nós chamamos de psiquismo, esta criança pede para ser abraçada, amparada, tutelada. Mas ocorre um fator altamente doloroso, esta criança é a maior trava de vossa inteligência. Ela não permite à psique manifestos inteligentes. Ela não permite a ação de movimentos que possam embasar, estruturar a sua autonomia. Por que ela foi educada para permanecer infantil, ela foi educada para ser dependente afetiva. (Fonte EEFE 07.02.2010 pág. 31)

Crescer implicará em encontrar o rastro desta criança, ouvir e dar vazão às suas dores, guiando-a em direção à transição a ser feita. Este quadro por si só já ressalta o quanto esse processo de crescimento pode ser doloroso. Dependentes afetivos e educados para permanecermos infantis, os desafios da adolescência se agigantarão na mente superlativa desta criança, parecendo intransponíveis, restando a ela criar os esconderijos psíquicos para se proteger.

O fato é que todos nós, candidatos a uma etapa de transição da consciência humana para a consciência espiritual, ou em outras palavras, transição da fase infantil para a fase adulta, somos atingidos por este intricado e angustioso processo psíquico.

Questionemos um pouco: O que implica adolescer? Como é deixar o corpo infantil para habitar um corpo novo, ainda não definido e que sofre alterações a cada dia? Como é transitar de uma realidade imaginativa, de um mundo de faz de contas e ilusões para o mundo real, com seus quadros que se afiguram tão duros, exigentes e por vezes cruéis? Como é renunciar a dependência de nossos mitos e heróis infantis: nossos pais? Como é enxergá-los não mais revestidos das qualidades mágicas e poderosas que lhes atribuímos com nossa visão infantil, mas como seres frágeis, deficientes, carentes e tão perdidos quanto nós? Como é se sentir só, profundamente só em meio a um mundo novo, onde tudo parece confuso e em constante mutação?

Tenho ouvido de alguns pacientes na puberdade e início da fase adolescente as seguintes indagações: “Qual a vantagem de crescer? Por que eu tenho que crescer? Crescer dói? Não vejo nada de bom em crescer, é chato e muito difícil.... gostaria de permanecer criança para sempre, é muito melhor.”

Acompanho terapeuticamente uma jovem há quase três anos. Atualmente ela conta com 18 anos e deu os primeiros passos este ano para deixar a “terra do nunca”, onde resistia bravamente aos chamados do crescimento.... lentamente foi identificando a criança em si mesma e penetrando no desafiante mundo da adolescência. Faço anotações dos atendimentos e solicitei que ela fosse escrevendo seus pensamentos e sentimentos num diário, como forma de obter algum alívio e processo de organização, o que possibilitará acompanhar nestes artigos algumas de suas falas para ilustrar o processo.

Tenho aprendido muito com ela e me emociono com seus relatos tão profundos do que está sentindo e vivendo. Há alguns meses atrás ela estava ali no meu consultório, corpo de mulher, mas encolhida como uma criança, olhar assustado, abraçada a uma almofada, chorava compulsiva e dolorosamente, num dos seus inúmeros encontros e confrontos com a sua criança perdida: “Não quero crescer.... e se meu pai não gostar mais de mim? E se ele começar a me achar sem graça? Sempre fui a menininha dele... acho que ele está sentindo que estou deixando ele e fica me abraçando, querendo que eu sente no colo dele, como se quisesse aproveitar meus últimos momentos com ele... Tenho medo de perder o amor dos meus pais, aquela magia de quando era criancinha... Acho que se crescer, tudo o que eu gosto vou perder e não vou ganhar nada em troca.”

Em outro relato, então em seu diário, coloca:

“Hoje meu irmão caçula chegou de viagem e meu pai falou para minha mãe: Nossa, como nosso filho tá grande, tá enorme, um homem, eu não tenho mais aquele alemãozinho. Nossa, pra mim isso foi super triste, sabe, eu fiquei triste por ele estar crescendo, por eu estar crescendo, por meus pais estarem sentindo falta de quando éramos criança e o pior é que eu não posso fazer nada sobre isso.”

Deixar a infância e penetrar na adolescência equivale a fechar um ciclo, portanto, enfrentar um processo de morte, onde aquela criança desaparece para dar lugar a um estranho. Trata-se de um luto para os pais e para o infanto. Sob o olhar assustado da criança ela vê ameaçado de desaparecer todo seu mundinho conhecido.... o corpinho infantil desaparece e com ele toda uma forma de sentir e pensar, um sentimento de solidão e desamparo, impotência e morte começa a invadir o psiquismo infantil, na chamada puberdade, onde o Ser começa a tomar contato com outra realidade que se aproxima a passos largos e ameaça arrastá-lo. Muito comuns neste período são os sonhos envolvendo a temática da morte e um súbito medo de que alguém próximo morra, como também são notadas significativas alterações de humor nesta fase, uma maior irritabilidade e um sentimento de tristeza que parece começar a tomar o lugar da vivacidade infantil.

Uma dura batalha começa a se manifestar na intimidade deste Ser que adentra à puberdade, como que prenunciando as lutas a serem travados no período adolescente. Sem o amparo de uma educação que possa lhe dar o suporte necessário para esta travessia, o caminho será não fazer a transição psicológica pela adolescência, configurando-se o desajuste entre a idade fisiológica e a idade psicológica, ou seja, o corpo avança e adentra as fases existenciais, mas o psicológico permanece preso à infância. O psiquismo está travado por uma criança que não pode crescer. O outro caminho possível é o processo de cindir com a realidade, dita esquizofrenia, por não ter sido estruturado para suportar as invasões do seu próprio psiquismo neste período, que lhe produzem dores atrozes.

Comparo a adolescência a uma comprida ponte que faz a transição inevitável de um lugar ao outro, mas uma ponte móvel, daquelas que a cada passo balança e nos mostra a instabilidade do momento, gerando temores e dando vontade de voltar para o firme ponto de onde saímos. É preciso coragem para se dispor a atravessar essa ponte, o medo de cair e de não conseguir chegar ao outro extremo é inevitável. Mais fácil seria essa travessia se pudesse contar com barras laterais para nos apoiar e oferecer o suporte mais seguro a cada passo dado. Feliz daqueles que podem contar com essas barras de sustentação na figura de educadores que se encorajaram e fizeram sua própria travessia.

Encerro estas linhas, como digo para mim mesma e para aqueles que partilham um pouco de suas Vidas comigo... Crescer dói! É exigente, doloroso e desafiante, mas infinitamente mais doloroso é ter em seu psiquismo uma criança escondida, afunilada e em estado permanente de angústia. Crescer dói, mas liberta!!!

Continuamos no próximo artigo, abordando um pouco mais sobre os esconderijos psíquicos da criança.

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